Como entendo classes sociais em meu trabalho de pesquisa
Volta e meia as pessoas me perguntam o que eu pesquiso no mestrado. Começo a explicar e tenho que aprofundar as conceituações que uso. Uma delas é a de classe social. Como desenvolver uma pesquisa exige refinamentos teóricos e conceituações, deixo aqui a conceituação de classe social utilizada por mim na pesquisa de mestrado.
“Entendemos classe social como um grupamento condicionado por
questões econômicas, em que indivíduos têm características socioeconômicas
semelhantes (i.e. a proletarização, a subproletarização)[1],
com relações simbólicas (por exemplo o consumo) determinadas por razões
econômicas (como a renda, acesso a serviços públicos fundamentais) e através da
relação de antagonismo simbólico e econômico (e simbólico porque econômico) com
outras classes sociais.
A
diferença que vemos entre classes sociais e grupos de status como definidos por
Bourdieu (1987) é que os grupos de status apenas cumprem o valor de classe no
sentido da consagração de sua função, sendo que, em sua teoria, o autor se
limita a falar de consagração sem estabelecer o processo do condicionamento
econômico. Nesse sentido, nos filiamos à teoria desenvolvida por Bourdieu
(1987) ao perceber que as classes não são grupamentos fechados em si, mas compostas
de modo heterogêneo (inclusive
com vários grupos de status em nosso entendimento), mas divergimos do lugar em
que o autor coloca a base econômica da sociedade para o condicionamento das
classes sociais. Sobre essa discussão, é preciso dizer que concordamos com
Block (2013) que, em sua concepção de classe social, compreende que a base
econômica não determina as classes sociais, mas as condiciona. Nesse caso,
temos dois verbos que precisam ser melhor delineados. Determinar é um termo
problemático na teoria marxista ortodoxa porque impõe que não existem relações
de classe social fora da estrutura econômica, no que discordamos. As relações
de classe estão dentro e fora da estrutura econômica, mas são diretamente
condicionadas por ela. Ou seja, a classe social não está determinada, mas é
condicionada pelas forças produtivas do capital econômico ou pelas forças
especulativas do capital financeiro. Por isso, o termo que melhor se aplica à
reação entre classes sociais e a base econômica é condicionar. Tal
condicionamento é o que faz as classes funcionarem enquanto classes.
De outro modo, a linguagem ocupa um espaço
relevante enquanto capital simbólico. É ela que desenvolve o papel político das
classes sociais fora da estrutura econômica. É na formulação de identidade que
a linguagem estabelece a caracterização das classes sociais. Para Fairclough (1992),
a identidade é construída pela linguagem. Portanto, a identidade não é um dado
da natureza, mas o resultado da política de representação estabelecida pela
linguagem, comportando-se como uma prática discursiva, a qual se enquadra numa
dada prática social. Como arcabouço construído pela linguagem, a identidade tem
significados que não naturais e fixos, mas provisórios, como se dá com a
própria linguagem. Tal é a relação de construção de sentidos do signo
linguístico. Para Bakhtin (1997), o signo é construído na interação,
contradizendo a teoria saussureana em que a relação entre significado e
significante é fixa. Segundo Derrida (1973) o signo é sempre provisório, sendo
que seu sentido nunca é completo".
[1] Para mais detalhes sobre o
significado da diferença desses dois termos e a relação com o trabalho no
Brasil, conferir Singer (1981).
Referências Bibliográficas
BAKHTIN, M. M. (Mikhail Mikhailovich). Marxismo e filosofia da linguagem:
Problemas fundamentais do metodo sociologico na ciencia da linguagem. 8.ed. São Paulo; Hucitec, 1997.
BLOCK, D. Social
class in Applied Linguistics. Londres: Routledge,
2013.
BOURDIEU, P.
A economia das trocas simbólicas. 2 ed. São Paulo, SP: Perspectiva, 1987.
DERRIDA, Jacques. Gramatologia. São Paulo: Perspectiva,
1973.
FAIRCLOUGH N. Discourse
and social change. Cambridge: Polity press, 1992.
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